terça-feira, 28 de abril de 2015

De que serve a pena de morte?

Marco Archer Moreira e Rodrigo Gularte: fuzilados na Indonésia, brasileiros
ajudaram a reacender o debate sobre a pena de morte

Nesta terça-feira, 28 de abril, Rodrigo Gularte foi fuzilado na Indonésia. Preso em julho de 2004 ao tentar entrar no país com seis quilos de cocaína escondidos em pranchas de surfe, Gularte foi o segundo brasileiro fuzilado por lá neste ano. O primeiro foi Marco Archer Moreira, fuzilado em janeiro, por ter sido flagrado ao entrar no país, em 2003, com 13,4 quilos da droga. 
Os dois episódios mobilizaram diplomatas, juristas, imprensa e, claro, geraram acalorados debates na internet. Por aqui, sobraram críticas aos apelos por clemência, empreendidos pelo governo brasileiro. Acusando a diplomacia brasileira de tentar proteger traficantes, os críticos pareceram se acomodar no argumento de que as leis da Indonésia são soberanas no território do país e, uma vez que os dois brasileiros infringiram a constituição local com plena consciência da gravidade dos delitos cometidos, deveriam, sim, ser punidos de acordo com o que estabelecem as leis do lugar.
Faz sentido, claro. Há lógica no pensamento e me parece um equívoco, nos dois casos, tratar os brasileiros como vítimas. Ou como heróis. O que, para mim, não faz sentido é esse ímpeto revanchista, de gente que festeja e defende cegamente a pena de morte. Estamos em 2015! Será que ainda não ficou evidente que a pena capital não inibe a prática criminosa? Quantas pessoas já perderam suas vidas sem que isso se traduzisse em queda significativa nos índices de delinquência? Ou seja: o que ganha a sociedade quando um criminoso julgado e condenado é assassinado?
Nada!
Não consigo conceber como alguém pode defender uma cena como essa, descrita na reportagem da Folha Online sobre a execução do brasileiro: "Gularte ficou preso a uma estaca com as mãos amarradas para trás e vestia uma camiseta branca com um 'X' preto na altura do peito, para facilitar a mira dos atiradores". Eram 12 atiradores, mas apenas três tinham a munição letal que matou o prisioneiro.
Também não faz sentido essa teimosia em não entender que qualquer Estado minimamente comprometido com a defesa dos direitos humanos precisa se colocar frontalmente contrário a qualquer forma de execução. Portanto, não se trata apenas das mortes de dois brasileiros. Trata-se de trazer para o debate a incompreensível manutenção de uma prática medieval e ineficaz, que só perpetua - e, de certo modo, legitima - a violência. 
Na Europa, por exemplo, nenhum país adota a pena de morte. 
O Estado Islâmico tem a prática de assassinar presos, homossexuais e inimigos.
Acho que somos bem melhores que isso. Fica a reflexão.


domingo, 26 de abril de 2015

#Globo50

Em série exibida para celebrar o aniversário do canal, JN trouxe de volta à bancada a dupla que mais tempo esteve no comando do principal telejornal da televisão brasileira: Cid Moreira e Sergio Chapelin

Eu soube o que era jornalismo pela tela do plim-plim. Na década de 80, cresci vendo Cid Moreira e Sérgio Chapelin dando notícias sobre o Brasil e o mundo e é muito viva a memória de, ainda pequeno, ficar espantado diante do poder (mágico?) daqueles dois homens de saberem tudo o que estava acontecendo no planeta.
Assim, fascinado e brincando de reproduzir o JN, cresci nos anos 80, diante da TV, filho único que era. Vi Leda Nagle fazer entrevistas com astros e estrelas no Jornal Hoje, dei muita risada com Os Trapalhões, me divertia com as aventuras de Juba e Lula na Armação Ilimitada e aprendi o que era deboche com a TV Pirata. Brinquei, cantei e dancei com a Turma do Balão Mágico e me diverti vendo Xuxa ser maluca sem medo de ser feliz em seu Xou.
Em 50 anos, Globo produziu mais de 300
novelas. Algumas, antológicas, como
Vale Tudo
Descobri a alegria de ver um filminho na Sessão da Tarde, acompanhei todos os clipes de Michael Jackson pelo Fantástico, viajei pelo mundo com o Globo Repórter e embarquei em histórias também fantásticas, de tramas como Que Rei Sou Eu?, Vamp, Vale Tudo, Mulheres de Areia, A Viagem, Perigosas Peruas, Cara e Coroa, Barriga de Aluguel, Roque Santeiro, Mico Preto, Lua Cheia de Amor e tantas outras; capítulos de uma história que teve episódios mais recentes em Avenida Brasil. Só nunca tive saco pra Malhação...
Se sou jornalista, em parte devo isso ao tal encantamento inicial pelo JN. Mas, se sou o que sou, e sou um apaixonado pela TV, devo muito disso à incrível capacidade de produção da TV Globo, ao seu rigor com a qualidade técnica, à valorização do talento nacional - e não digo só dos talentos artísticos - e a tantos maravilhosos produtos criados e transmitidos pela agora cinquentenária emissora para todo o país. Sim, temos uma das melhores e mais diversificadas televisões abertas do mundo. E isso, em grande parte, deve ser creditado à ação da Rede Globo.
Por mais críticas que possam ser feitas ao posicionamento político-editorial da empresa em alguns momentos da história do país - inclusive os mais recentes - é impossível não concordar que a TV Globo tem um peso imenso na formação e na consolidação dos valores, da cultura e da própria sociedade brasileira. 
Por isso, pra mim foi especialmente emocionante rever Cid Moreira e Sergio Chapelin na bancada do Jornal Nacional na última sexta. Não pelo que disseram, mas pelo que representam nessa minha particular viagem de construção do que sou. E por perceber como tudo aquilo tudo ajuda a me explicar. E a me entender.
Nesse 26 de abril de 2015, os meus parabéns aos colegas que trabalham na TV Globo. E a todos que por ela passaram e ajudaram a erguer essa potência da comunicação do Brasil. 
Plim-plim!!!

sábado, 25 de abril de 2015

120!

E quando achava que nunca mais, veio a vida a mostrar que, inocentes que somos, sabemos de nada!
E veio o encontro, e vieram os sorrisos, os beijos, a parceria, os abraços. 
Veio aquele nós. Aquele jeito de sermos nós. 
E veio tudo o que nos pertencia e que passamos a compartilhar: pessoas, ideais, rotas de viagem, sonhos, desejos... 
Um tudo que é tanto e que ainda parece tão pouco diante do que pode vir a ser. Diante do tamanho do brilho que irradia dos nossos olhares cruzados. Diante dos corações que estiveram abertos desde o primeiro encontro, desde a saudação inicial. Um tudo que soa como convite para o todo mais de que somos capazes.
Como todas as mais belas flores, nosso tudo também tem espinhos. Sim, a gente também se corta, sangra. Assusta? Sim, claro. Mas só prova que o real é muito mais vivo e belo que qualquer simulacro.
Ou alguém conhece quem prefira flores de plástico? Afinal, se é verdade que elas não morrem, também é verdade que elas não perfumam ambiente algum.
Como também é verdade que minha vida tem sido muito mais cheirosa de uns tempos pra cá...

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Sobre o caso Verônica Bolina...

O que explica o silêncio diante da tortura sofrida pela travesti dentro da cadeia?

Ontem, via Facebook, vi várias postagens que traziam as fotos de uma travesti com o rosto completamente desfigurado. As imagens pipocaram desde o último fim de semana e, de tão chocantes, acabaram por me afastar do fato aterrador que elas ilustravam. Mas ontem, soube de algo que acabou me fazendo correr atrás da história: eu conheci a travesti que aparecia deformada naquelas fotos. Sim, eu conheci Verônica Bolina! Nunca conversamos, é verdade, mas Verônica e eu malhamos na mesma academia por um bom tempo. Voltei às fotos. E fiquei completamente chocado...
Pra quem não sabe, Verônica, uma travesti, presa e sob tutela do Estado, foi aparentemente espancada por policiais depois de uma violenta (suposta) briga com um agente penitenciário. Mais que isso: teve seu cabelo raspado, foi fotografada seminua, desfigurada e teve tais imagens divulgadas na web. Uma vez denunciada a barbárie oficial, órgãos de imprensa passaram a reproduzir a notícia sem levar em conta a versão da travesti, quase que naturalizando o absurdo da situação.  
Não me interessam os motivos que levaram Verônica para a prisão. Também não me interessa que ela tenha se envolvido numa briga. Para os dois casos, a lei: ela deve ser investigada e punida com o máximo rigor previsto na nossa legislação. Nem mais, nem menos. Mas não se pode tolerar, aceitar ou compactuar com qualquer forma de violência e opressão praticada pelo aparelho oficial. O Estado não pode tratar cidadãos e cidadãs como se estivesse acima da lei! Ao agir como agiram, seja sob qual pretexto o tenham feito, os homens da lei deram as costas para as regras acordadas pela sociedade e pactuadas na constituição e impuseram a todos nós uma lei outra; paralela, oficiosa. Igualaram-se - ou superaram - o que há de mais marginal em nosso país.
A repercussão do caso na mídia nos primeiros dias também chama atenção. Primeiro, pela já exposta simpatia inicial ao discurso oficial, desprezando qualquer possibilidade de análise crítica dos fatos. Segundo, pela exposição de Verônica, ferida e sem roupas, como uma espécie de troféu, em textos que desconsideravam a identidade de gênero de Verônica, tratando-a com pronomes masculinos. Uma prática que parece legitimar o tratamento covarde e desumano recebido pela travesti. É como se fosse o Estado a dizer: "É assim que tratamos travestis negras", com a mídia a lhe dar tapinhas nas costas. E terceiro, por expor o assombroso silêncio que paira quando o assunto é a violência contra travestis e transexuais no Brasil.
Negra e travesti, Verônica Bolina é uma representante da parcela da população mais vulnerável à violência e aos crimes de ódio. Segundo o deputado Jean Wyllys, em texto postado no Facebook, "pesquisa sobre os direitos das trans negras no Brasil, publicada pela ONG internacional Global Rights, corrobora a realidade dessa população, impactada desproporcionalmente por diversas formas de violência física e sexual. Os dados da pesquisa foram apresentados durante uma audiência temática sobre os direitos das pessoas trans negras no Brasil diante na Comissão Inter-Americana de Direitos Humanos”.
O tratamento dado ao caso ajuda e entender os resultados da pesquisa. Exposta, humilhada e torturada, aos olhos da sociedade, Verônica não parece ninguém. É mais uma travesti negra a confirmar seu destino trágico. Como num filme que se repete e para o qual não se deseja imaginar um novo fim. 
Acontece que é muito perigoso escolher quem "merece" ser tratado dentro dos limites das leis, sem lembrar que a legislação é para todos - assim como também o são os direitos. Afinal, quando os direitos de um são violados, todos perdemos. E, nesse caso, o silêncio, a legitimação de uma prática policial criminosa, o deboche e a relativização demonstram que, pior do que deixarmos que a violação aconteça, nós ainda somos capazes de aprová-la e aplaudi-la. 
Triste da sociedade que acha aceitável que cidadãos recebam tratamento desigual do Estado. Primeira e segunda classes até podem funcionar nos aviões mas, na sociedade, são apenas a tradução da pouca civilidade e do descompromisso com o coletivo, traços de uma nação que parece insistir para se perpetuar excludente. 

terça-feira, 14 de abril de 2015

Autópsia de Famosos: o buraco da bizarrice na TV é mais embaixo

Whitney e Michael: protagonistas de uma série bizarra na TV paga
Quando vi a chamada anunciando a exibição de um programa sobre a autópsia de famosos, fiz piada. A morbidez do tema, associada àquela que pode ser a mais invasiva das invasões de privacidade, fez com que eu me espantasse com a sanha dessa mídia de celebridades, sempre ávida por cavar mais fundo o buraco do poço. Não podia ser sério.
Mas era. E lá fui eu conferir...
Vi dois episódios de Autópsia de Famosos: sobre Whitney Houston e Michael Jackson. O programa dedicado à cantora eu vi no Discovery e o baseado no exame cadavérico do Rei do Pop, vi pelo YouTube. A produção é merecedora de todas as críticas do primeiro parágrafo. Como mérito (?) apenas a capacidade de trazer informações curiosas que, a meu ver, só servem para aplacar a sede de ardorosos fãs - dos astros e de fofocas.
Não dá pra ver um programa como esse e não pensar na doença desse nosso tempo louco. Não pode ser algo aceitável que dados da intimidade de alguém - ainda que famoso - sejam expostos em escala internacional depois da morte. É como se, de um modo cruel, a indústria do showbizz seguisse negando sossego e descanso eterno aos astros e estrelas que tanto importunou em vida. Um espetáculo sem fim, bizarro e sensacionalista.
Pensar na imensa quantidade de drogas ingeridas por Michael em sua última tentativa desesperada de dormir é assustador. Como também surpreende e choca saber que Whitney Houston, completamente entorpecida, mergulhou para a morte numa banheira de água escaldante; tão quente a ponto de lhe causar queimaduras na pele...
Duas mortes tristes, sem dúvida. Sozinhos e diante da possibilidade improvável do retorno ao estrelato, quando morreram, cada qual a seu modo, Whitney e Michael fugiam desse esquema gigantesco, que gruda nos astros e estrelas como parasitas, e segue lucrando em cima de seus cadáveres. 
Não dá pra não achar que o capitalismo foi longe demais quando a gente vê laudos de necropsia virarem show de TV. Mesmo quando esses laudos trazem informações de duas das maiores estrelas da música do século passado...

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Eu, Muka. E o meu blog...

Meu pai me chamou de Muka pela primeira vez depois de ver um cara, também chamado Murilo, revelar esse apelido num programa dominical comandado pela Xuxa. Era o "Bobeou, Dançou", exibido pela Globo há vinte e tantos anos.
Daquele domingo em diante, nunca mais meu pai me chamou de Murilo...
Depois que ele morreu, apenas alguns familiares mantiveram vivo o apelido dado pelo meu velho. E, com a chegada das redes sociais, a necessidade de um login original me vez adotar o codinome mais constantemente. Assim, assumi ser Muka no e-mail, no MSN e, tempos depois, no Instagram. E mais e mais gente passou a me chamar assim, independentemente do nível de intimidade existente em nossa relação.
Hoje, quase 10 anos depois de ter decidido ter um blog na internet para dar vazão às ideias e inspirações que não encontravam espaço na minha atividade profissional, lanço um novo blog. Um blog com um acervo de mais de dois mil textos publicados no meu primeiro blog, o B@belturbo, onde conquistei leitores, fiz alguns amigos, conheci outros blogueiros, fiz entrevistas com gente famosa e experimentei as dores e delícias de ser blogueiro até que o Facebook viesse e levasse todas as minhas ideias para a Timeline...
Com o Blog do Muka vai ser diferente. Minhas ideias terão sempre um lugar cativo aqui. Você também terá sempre um lugar especial aqui. E terei, a partir de agora, um espaço pra ser eu mesmo, com meu nome, minha cara, minhas ideias e minha identidade.
Sejam bem-vindos: o blog é meu, mas a casa é nossa! :)

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Eduardo: mais uma vítima do nosso esquecimento..

Eduardo: mais um "futuro bonito" que nunca vai chegar...
Eduardo de Jesus Ferreira tinha 10 anos. Passava 10 horas por dia no colégio, um CIEP de Olaria. Era filho de uma diarista. Sonhava com um futuro bonito e dizia à mãe que a amava várias vezes por dia.
Que tristeza ter de escrever esse texto conjugando todos os verbos no passado...
Eduardo foi mais uma triste vítima da tragédia da segurança pública de uma cidade que, em vez de extinguir abismos, apenas resolveu fingir que eles não mais existiam. Um Rio de lágrimas - e de sangue - que segue mais partido do que nunca.
Eduardo foi morto e vi no Twitter sua foto sem vida. Terrível, trágica, dolorosa. Estirado e ensanguentado como jamais deveriam aparecer nos jornais meninos de sua idade - sobretudo quando a absurda extinção de suas vidas decorresse de tamanha negligência. De tamanho descuido. De tão absurdo silêncio de todos nós para uma história que se repete à exaustão. Não exagero: na última década, no Rio de Janeiro, 50 crianças foram mortas por policiais em incursões tratadas como rotineiras pelo Estado.
O que se faz diante disso?
Nada.
A gente sofre, a gente se entristece. E vem um novo escândalo, vem uma nova manchete terrível; vem uma nova piada no whatsapp. 
E a gente esquece.
A gente esquece do Eduardo, esquece da dor incurável da mãe que estava se desdobrando para pagar cursos de inglês e informática pro garoto. A gente esquece do futuro bonito que ele nunca vai ter. Esquece de todas as contribuições que ele poderia vir a dar para ajudar a curar essa sociedade doente, covarde, assassina. Sim, a gente esquece que empurrou o policial para aquele tiro. A gente esquece que naturaliza, dia após dia, o inaceitável. A gente esquece que o escândalo seria muito maior se Eduardo de Jesus Ferreira morasse na Vieira Souto. A gente esquece que há lugares em que a polícia jamais entraria como entra no Complexo do Alemão. A gente esquece que vive num contexto em que o CEP determina como o cidadão vai ser tratado. E esquece que esse tratamento se desumaniza proporcionalmente à redução do valor do IPTU.
A gente se esquece porque é covarde. Porque se acostumou a achar que as coisas são assim. E porque não sabe como ou o quê fazer para alterá-las. 
Queremos alterá-las?
A gente se esquece porque é cômodo. Porque Eduardo, infelizmente, não foi o primeiro e não será o último. 
Quantos mais serão?
A gente se esquece porque favela é perigoso. Porque acha que - como ouvi dia desses - quem mora lá já sabe que o futuro pode nunca chegar.
E chegará?
A gente se esquece, sobretudo, porque vem esquecendo a cada dia mais o que significa a palavra humanidade.
Humanidade?