quarta-feira, 25 de março de 2015

90!

Com a serenidade de quem já podia experimentar, dia após dia, a graça de descobrir uma nova (co)existência, agradeceu. Agradeceu pela parceria, pela ternura, pelo cuidado, pelo feijão saboroso, pelo fim do Nescau com açúcar, pelas mãos dadas no teatro, pelas conversas serenas, pelos desabafos, pelas confissões. Agradeceu a confiança, os sorrisões, a doçura da voz a lhe despertar, os emoticons de beijo, coração e flores. Agradeceu pelas descobertas, pelos sonhos, pelos planos, pelos conselhos... 
E, mais que tudo, agradeceu por ter a prova de que, sim, todo o amor é sagrado. E pode ser, também, sereno.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Um dia estranho

Manifestação com pauta difusa cedeu espaço para reivindicações absurdas

Acho que toda e qualquer manifestação realizada com o objetivo de cobrar direitos e serviços é válida. Do mesmo modo, também considero salutares as demonstrações coletivas que tenham o objetivo de pressionar governos - em qualquer nível - para, assim, lembrá-los que os interesses dos cidadãos devem ser considerados quando da tomada de decisões.
Embora as considere pouco efetivas, acho também pertinentes as manifestações coletivas contra a corrupção e a impunidade. E me explico: visto que ninguém se assume publicamente favorável a uma ou outra coisa, sair às ruas manifestando essa contrariedade parece clamar pelo óbvio; parece coisa de quem não consegue enxergar além do senso comum. Creio que manifestações dessa natureza carecem de uma pauta clara, de um objetivo comum. No momento atual, penso, a pauta para quem pretende combater esse combate é a da reforma política. E me incluo nesse grupo, vale dizer.
Acontece que as manifestações de ontem pareceram boiar num mar de senso comum. E, pior do que isso, quando se permitiram ir além desse pensamento mediano, tomaram caminhos assustadores. Não consigo conceber um cidadão de bem, ainda que incomodado com a atual situação do país, que se permita militar nas ruas ao lado de alguém com uma faixa onde se vê a suástica. Igualmente me intriga pensar nas "famílias inteiras, em clima de paz" dividindo a rua com pessoas que empunhavam cartazes onde se lia - inclusive num inglês constrangedor - clamores pela volta da ditadura militar. 
"Eram poucos", alguns dirão. Não importa, respondo. Ao dividir o mesmo espaço com gente assim, você valida esse discurso. Ao aceitar militar ao lado de quem defende pautas radicais, extremistas e ilegais, você caminha para se tornar mais um deles. Aliás, nas fotos e imagens de TV, nas estatísticas da polícia, "dos organizadores" e dos institutos de pesquisa, quem escolheu marchar ao lado de pessoas com tão deprimentes reivindicações já se tornou um deles. 
Por fim, lembram de um ditado popular sobre se misturar com porcos e comer farelo? Pois bem. Entre os "convocadores" dos protestos de ontem, estavam Silas Malafaia, Marco Feliciano e Jair Bolsonaro. Gente que, talvez, até traga algum orgulho para quem resolveu ganhar as ruas e assinar o cheque em branco em que se converteram essas passeatas sem foco. Mas, pra mim, esse é o tipo de gente que sempre estará do outro lado. 
Obrigado, mas do farelo deles eu só posso querer distância.

quarta-feira, 11 de março de 2015

O Brasil precisa amadurecer

Cinco meses depois das eleições, eleitores ainda se digladiam como se Dilma e Aécio
ainda estivessem disputando. E o país só perde com isso...
E nos últimos dias, reeditando um triste fenômeno que muita gente pode vivenciar durante os meses da última campanha eleitoral, as redes sociais voltaram a se transformar num campo de batalha. E não me utilizo de uma figura de linguagem; não se trata de uma metáfora, uma vez que a luta não se dá no campo ideológico. São ofensas, agressões, insultos e arranca-rabos de todos os graus. Tem de tudo, menos maturidade...
A cena política brasileira se converteu nos últimos tempos numa espécie de 8 ou 80 que, além de limitador, só tem empobrecido o diálogo e impedido o avanço do país - e do pensamento. E, pior do que isso: diante dessa polarização, os dois lados passaram a contar com defensores / torcedores apaixonados, que tratam o país como um grande campeonato de futebol; ignorando a premissa básica de que, nesse caso, todos os brasileiros deveriam lutar por um objetivo comum e que, assim sendo, a vitória não seria de eleitores do PT ou do PSDB, porque um Brasil melhor, de pé, será melhor para todos nós.
Atribuir a um partido a responsabilidade pelos males do país - sobretudo o mais grave deles, a corrupção - é, com boa vontade, ser desonesto. Desonesto com a história, com os fatos que a escreveram e continuam a escrevê-la e com aquilo que, se ainda não é, deveria ser do conhecimento de todos: não se pode estipular uma data de início da roubalheira em nosso país. Por quê? Porque aqui, infelizmente, sempre se roubou. E muito! Ou alguém se esquece que fomos uma colônia de exploração e que, portanto, o que aqui se obtinha não era aplicado em benefício do novo território e de seu povo? Se os barões contemporâneos mandam seus dólares por vias escusas para os paraísos fiscais, séculos atrás era o império a abrir a boca pra surrupiar as riquezas aqui extraídas. Não me parece estranho supor que essa lógica tenha se cristalizado e, repetida geração após geração, tenha acabado por parecer natural.
Ainda nessa perspectiva histórica, que tal se dermos um salto no tempo rumo a um passado menos remoto? O passado da ditadura militar. Censura ampla, geral e irrestrita; sindicatos e organizações privados de um funcionamento livre, imprensa amordaçada. É possível crer que não se roubava nessa época? É aceitável a ideia de que, num cenário em que sequer era fiscalizado pela imprensa e por outros organismos, o governo agia com retidão? Desculpem-me, mas pensar assim me parece inocência. Ou ignorância. Ou, reafirmo, desonestidade! E não me venham falar que o país era melhor naquele sombrio período em que os opositores eram mortos, desaparecidos, presos, expatriados, silenciados! Época em que, como vira e mexe lemos, a silenciada corrupção já levava muito.
Hoje, temos um país aberto, democrático. Uma imprensa livre - e questionável, claro. Avançamos nesses dois pontos mas, no terreno da política, a época ainda é a das cavernas. Enquanto parlamentares querem definir o conceito de família seguindo preceitos religiosos; enquanto há uma bancada da bala no parlamento; enquanto um deputado ofende mulheres, negros e homossexuais sem que nada lhe aconteça; enfim, enquanto tudo isso tomou de assalto os noticiários, Brasília foi virando uma espécie de pastiche de si mesma. O congresso, eleito para nos representar, não teve pudores de negar qualquer movimento favorável a maior participação popular nas tomadas de decisão. Congressistas também não tiveram vergonha de dizer não a um plebiscito que envolvesse a sociedade na construção de uma reforma política. Ou seja: em dois casos - e há outros - não houve a menor disposição em sequer disfarçar que os desejos da sociedade não lhes interessam. E a nós? 
Bem, nós nos calamos.
Nós vergonhosamente, covardemente e tristemente nos calamos!
Iniciado o segundo mandato de Dilma, as medidas impopulares vieram. Eram favas contadas, como sabiam - e defendiam - todos os economistas. Era o que havia por ser feito. Era o que Aécio também faria - e talvez, sob o PSDB, o país viria a experimentar um ajuste ainda mais rigoroso. 
Pois bem: era o que pedia o mercado. Era o que faria a oposição. Era o que teriam os eleitores do candidato tucano. Dilma fez. Resultado: o mercado, a oposição e os eleitores de Aécio se voltaram contra o governo. Setores da mídia, mais raivosos que qualquer partido de oposição, também se voltaram contra o governo. Não dizem, mas tá na cara! Tá nas manchetes, tá nas fotos, tá na cara dos colegas que emprestam seus corpos e vozes para que os donos da informação digam e defendam o que querem. O que querem pra si e o que querem nos fazer crer que também queremos. E nós?
Bem, alguns de nós bateram panelas.
Sim, alguns de nós, vergonhosamente, covardemente e ridiculamente batemos panelas!
Os jornais não dizem isso claramente, mas as panelas estridentes não ressoaram nas periferias. Talvez por lá estivessem todas cheias na noite do último domingo. Talvez as classes mais populares não tenham tantos motivos para protestar contra o governo. Talvez as classes mais populares tenham entendido que as eleições acabaram e que o momento é de trabalhar - governo e sociedade - para que o país entre novamente nos trilhos. Talvez as classes mais populares não engulam tão facilmente a ideia de que "nunca se roubou tanto no país" porque nos últimos anos, como indicam todos os índices, pela primeira vez em nossa história lhes tenha sido oferecido uma parte do bolo do crescimento da economia brasileira.
Agora, enquanto informam, jornais e TVs reforçam a existência de uma "grande manifestação" marcada para o próximo domingo, num explícito exercício de futurologia, uma vez que não se deveria adjetivar uma manifestação que ainda não se concretizou, ainda não ocorreu. Tempos estranhos...
É óbvio que o clima não é bom. É óbvio que a popularidade do governo está em xeque, sobretudo depois das tais mudanças impopulares - que não têm esse nome aleatoriamente. Mas também me parece óbvio que há um movimento oportunista que quer se valer disso para desestabilizar ainda mais o andamento do país; sim, porque desestabilizar um governo é comprometer o andamento do país. Mais que isso: esse movimento se aproveita da notória carência de formação ( e informação) política de grande parte do eleitorado.
O fato é que temos um sistema político viciado em corrupção e uma população que centraliza suas expectativas e cobranças no Executivo, sem dar a menor importância ao Legislativo. Depois, quando vem à tona um escândalo que apenas confirma aquilo de que todos sempre desconfiavam, a conta toda é jogada no Planalto. Talvez porque seja mais fácil. Talvez porque não se tenha cultura política para envolver toda a sociedade na fundação de um novo modelo. Talvez porque estejamos contaminados demais pelo imediatismo, por essa onda tão descartável; não serve, troca. E aí vai desde o celular até a presidência da república. Não sou a favor do "Fora, Dilma", não fui a favor do "Fora, Lula" e nem do "Fora, FHC". Democracia não é Lego, não dá pra agir montando e desmontando cenários. 
O Brasil precisa amadurecer muito e a conjuntura atual só reforça isso.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Xuxa na Record: o fim de uma era

Depois de dois anos de negociação, Xuxa mostra contrato assinado com a Record
A televisão brasileira, sobretudo a Rede Globo, foi forjada tendo como base o ‪#‎StarSystem‬ de Hollywood. Se lá os grandes astros e estrelas eram exclusivos dos grandes estúdios, por aqui a Globo cresceu segurando seus maiores nomes em longos contratos que os impediam de ser roubados pela concorrência. Salários polpudos, mesmo para aqueles que passavam longos períodos fora do ar, sem trabalhar. Sim, por muito tempo a Globo pagou caro para ter aqueles que considerava os melhores valores do mercado em seu elenco. Por isso, não dá pra imaginar Cid Moreira narrando o "Fala que eu te escuto", nem a Glória Maria fazendo um programa qualquer de viagens na Rede TV. Por isso a gente estranharia ver o Bial apresentar "A Fazenda", o Tarcísio Meira sendo vovô das órfãs de Chiquititas, no SBT, ou a Glória Pires interpretando Paulina e Paola num remake de A Usurpadora, na mesma emissora. Também por isso pareceria bizarro ver Roberto Carlos apresentar seu especial de fim de ano na TV Cultura. Todos são astros da Globo; e vale dizer que, não por acaso, "global" é um adjetivo que identifica o vínculo do artista com a emissora carioca.
Outros canais seguiram o exemplo dos artistas exclusivos e, nas vezes em que esqueceram de rezar pela cartilha, se arrependeram. Foi o que aconteceu ao SBT, quando perdeu Hebe para a Rede TV e acabou sendo criticado por virar as costas para uma de suas maiores estrelas. Também é por isso que ver a ‪#‎XuxaNaRecord‬ desperta tanta curiosidade, tanto estranhamento. 
Hebe sendo recepcionada na Rede TV,
depois de sair do SBT
De uns anos pra cá, a estratégia de ter numerosos artistas contratados por valores exorbitantes vem sendo revista tanto pela Globo quanto pelas demais emissoras. Os tempos são outros, bem mais difíceis. Aliás, de volta ao caso da Hebe, foi essa a razão que impediu Silvio Santos de mantê-la sob contrato com vencimentos considerados estelares. Sugeriu reduzir o salário, o staff de Hebe não aceitou e ela acabou assinando com a Rede TV - que viria, aliás, a atrasar o pagamento da contratada pouco depois. Com Xuxa o processo foi semelhante: salário alto e pouco retorno comercial e de audiência. E um agravante: a direção da Globo não via mais espaço para a loira na grade de programação. Assim sendo, a única saída foi mesmo a concorrência.
Em 2009, Gugu deixou o SBT e
assinou com a Record
A ida de Xuxa para a Record parece sinalizar para o fim definitivo da era em que o artista era a cara de uma emissora. Nem a saída de Gugu para a mesma Record, anos atrás, rendeu a mesma repercussão. E vale lembrar que, no SBT, ele era apontado como o sucessor natural de Silvio Santos. Talvez, o único paralelo com essa mudança de emissora da Rainha dos Baixinhos fosse uma eventual saída de Silvio Santos do SBT o que, sabemos, é impossível. 
A contratação de Xuxa pela Record, celebrada hoje, já desponta como uma das mais caras da história da televisão no Brasil. Foram muito raras as vezes em que um artista tão identificado com a emissora líder de audiência foi para a concorrência. E, no caso em questão, a despeito de ter permanecido na geladeira global ao longo do último ano,  Xuxa segue como um dos rostos mais identificados com a Globo, onde esteve por quase 30 anos. Desconfio que Boni e Roberto Marinho jamais concordariam com a saída de uma estrela desse patamar do cast do canal. E, a julgar pelo imenso barulho causado nas redes sociais hoje, acredito que a Record pode ter feito um grande negócio. O público, deu pra ver, segue fiel à estrela. Resta saber quais as outras mudanças que ela prepara para surpreender os fãs. Resta saber como o público vai reagir à mudança quando o novo programa de Xuxa estrear. E resta saber como a Globo vai se armar para enfrentar a ex-estrela... 

segunda-feira, 2 de março de 2015

Rio 450: que cidade estamos celebrando?

O "meu Rio" passa por aqui. É alegre, festeiro e bonito. Tem problemas. Mas é real...
Ontem, primeiro de março de 2015, o Rio de Janeiro completou 450 anos. Mas, ao menos na maior parte dos jornais e do noticiário da TV, o aniversário parecia ser apenas de parte da cidade. Sim, a Zona Sul foi celebrada como a mais perfeita tradução da carioquice; como se o Rio estivesse limitado aos contornos da orla, aos calçadões, monumentos e postais das praias, praças e avenidas com os IPTUs mais caros da capital fluminense.
Sobre o Rio de Padre Miguel, Bangu, Realengo e Campo Grande não vi palavra. Santa Cruz? Nada! Valqueire, Irajá, Vaz Lobo, Méier, Senador Vasconcellos, Jabour, Sulacap, Campinho, Cascadura, Praça Seca, Freguesia...todos igualmente esquecidos. Pareciam partes de um Rio que pouco, quase nada tem a comemorar. Isso sem falar na Coreia, no Alemão, em Costa Barros, Vila Kennedy, Acari, Cesarão, Rio das Pedras, Engenho Novo; áreas de uma cidade que segue partida e que, sabemos, realmente têm poucos motivos para qualquer celebração.
Os jornais e as emissoras de TV até se esforçam, vez ou outra, mas em episódios como esse fica evidente o desconhecimento e a distância que suas redações conservam do Rio real; que está afastado dos pontos turísticos, dos lucros exorbitantes das empreiteiras sempre tão interessadas em obras faraônicas, dos homens e mulheres sarados que lotam as praias de segunda a segunda. Na TV, em geral, periferia só aparece quando o assunto é violência. E, uma vez por ano, no carnaval; quando o restante da cidade parece se lembrar  de que é das comunidades mais populares que emerge a mais genuína das expressões da cultura popular: o samba.
Lembro de um episódio que foi muito marcante na minha formação. Faz uns 10 anos. Eu já trabalhava na TV e me surpreendi com uma manchete em letras garrafais que estampava a página de um grande jornal. A notícia era um tiroteio no Leblon, "à luz do dia". Tiroteios são sempre assustadores, claro; não se pode tomá-los com naturalidade. Mas a razão do meu espanto era o tom da matéria; como se fosse aquele um fato inadmissível não pela violência, não pelo uso indiscriminado das armas, mas única e exclusivamente pela localização do confronto. Dava a clara impressão de que, fosse na Rocinha, na Taquara, na Ilha do Governador ou em qualquer área menos valorizada, o tiroteio seria aceitável; normal, até. Mas ali, no Leblon, talvez a poucas quadras dos apartamentos dos donos do jornalão; ali, não!
Fiquei chocado! E nunca vi o jornal dar o mesmo destaque a qualquer episódio semelhante acontecido no subúrbio, na zona oeste ou em áreas "menos nobres"
do Rio. Claro: o Rio, para eles, sempre foi o que está além do túnel.
Mas o Rio de verdade resiste, sem filtros embelezadores, sem photoshop e sem sair nos jornais. Resiste apesar dos políticos, apesar da violência, apesar dos autos de resistência que encobrem o extermínio de uma geração inteira, apesar do trânsito caótico, apesar dos serviços que só pioram, apesar da intolerância de quem invade e destrói terreiros por não aceitar a coexistência de outras crenças, apesar do ódio homofóbico que não percebe a inequívoca vocação deste lugar para o amor, apesar das balas - e de algumas esperanças - perdidas, apesar dos sonhos negados pra quem vem - e vive - nas periferias, apesar da especulação imobiliária e apesar da eterna despoluição da Baía de Guanabara; apesar de tudo isso, o Rio resiste! O Rio segue sendo a capital da beleza e do caos, segue com 40 (e tantos) graus, segue sendo a mais maravilhosa dentre as maravilhosas cidades do mundo. O Rio segue sendo meu orgulho, minha casa e minha paixão.
Parabéns, Cidade Maravilhosa! E que os próximos 450 anos sejam melhores para os cariocas de todas as partes...