terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

O desconhecido cotidiano da Nova Holanda...

(Foto do projeto "Imagens do Povo". Clique para ver maior)
Projeto de fotografia realizado em comunidades do Rio de Janeiro encara a comunicação como um direito humano e mostra que, nas favelas, nem tudo é como a TV e os jornais mostram...
Faz tempo que, nos noticiários, favela virou sinônimo de violência. Uma lógica cruel, que acaba por colocar os moradores dessas comunidades num grande balaio de gatos onde se misturam o tráfico de drogas, a polícia corrupta, o descaso das autoridades e um tanto de outros dados que a sociedade briga pra continuar a não ver.
Mudar essa lógica e mostrar o belo que há nessas comunidades é um dos principais objetivos do "Imagens do Povo", um centro de documentação, pesquisa e formação criado pelo Observatório de Favelas, localizado no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro.
Desde que o Tim Lopes foi assassinado, todos sabem, jornalistas passaram a ser vistos como ameaças em algumas comunidades dominadas pelo crime organizado. Por isso, gravar nessas localidades acaba virando motivo de apreensão. O que mais ouço, por exemplo, quando digo que vou gravar numa favela é: "Caramba! Cuidado!". E não foi diferente quando as pessoas próximas souberam que eu iria, hoje, ao Complexo da Maré pra gravar com o pessoal do Observatório.
Pois lá fui eu e, logo na primeira entrevista, notei que estava conhecendo uma iniciativa cheia de significado pra toda gente que vive nas 16 favelas que formam o Complexo. Um lugar cheio de mazelas, sim, mas também cheio de gente feliz! Como a Jô, de 55 anos, moradora da Cidade de Deus, que resolveu fazer o curso de fotografia depois que o marido se formou na turma do ano passado. Sorridente, a paulista me conta que agora vive como retratista - tal qual o marido - e dedica-se a registrar imagens das mulheres trabalhadoras da CDD, pra provar que favela "não é só lugar de mulher que gosta de baile funk!".
Lá tem gente batalhadora; gente disposta a olhar o trabalho da mídia com uma visão crítica. Paulo Henrique é um exemplo: "A mídia vem aqui, tira fotos e mostra que aqui só tem criminoso, gente desonesta! E não é verdade!". Só discordei do Paulo quando ele se referiu a mim e à minha equipe como "vocês que são da cidade". Sem querer, ele repetia um discurso que acaba por legitimar a lógica da exclusão, considerando os moradores de favelas como habitantes de um espaço outro que não o da cidade. Deslize inocente na boca do Paulo, mas grave quando rege decisões, investimentos governamentais; e forma opiniões da chamada "sociedade".
E foi lá que vi fotos lindas, cedidas pela turma do projeto para a edição doa reportagem. Fotos que mostram o cotidiano das comunidades da Maré, nas quais aparecem crianças sorrindo, distraídas com suas brincadeiras inocentes e deliciosas. Imagens de um dia-a-dia cheio de cor e movimento, cheio de contrastes e luz. Uma rotina que encanta o Valdean, responsável pelo banco de imagens do projeto, com um acervo de mais de 3.000 fotos catalogadas.
Valdean, pouco mais novo que eu, é aquele tipo de cara que nos faz crer que um mundo novo é viável. Tem brilho no olhar, paixão pelo que faz e acredita verdadeiramente que as coisas podem ser diferentes. E a diferença dessa iniciativa do Observatório foi premiada pelo jornal O Globo; uma boa notícia que Valdean me deu cheio de orgulho. O mesmo orgulho exibido ao mostrar as fotos dos colegas de projeto e ao narrar as conquistas - umas simples, outras grandiosas - que já marcam a existência do "Imagens do Povo".
Enfim, foi uma manhã feliz. Colorida e alegre como o cotidiano - desconhecido por muitos de nós - da comunidade de Nova Holanda. E só me resta agradecer ao povo do Observatório pela acolhida, pela paciência, e por mostrar que nem tudo é exatamente do jeito que parece! Felizmente!
Se você quiser conhecer mais sobre o projeto, aqui está o blog da turma. Tem fotos belíssimas, vale a pena!
Valdean também tem um blog! Aqui está o link!
Se gostou do tema e quiser conferir o resultado das gravações, é só ficar ligado no Salto! Vai ao ar em março...

2 comentários:

  1. Muito bacana seu bloger!!!!!!!

    O texto então nem se fala, só mostra o quanto você é sensivel a nossa realidade, não a realidade das favelas mas a realidade que a nossa sociedade cria desses espaços e usa principalmente os meios de comunicações para formar essa opnião. Antigamente eu sempre me referia a midia como a principal responsavel por esse ponto de vista, mas agente vai ficando maduro e vai entendendo melhor o mundo, é claro que sem duvida nenhum a midia é o meio por onde parte da classe dominate vende seu "peixe" Mas conhecendo pessoa como vc e outras tantas que atuam nesse memso meio agente acaba entendendo que a tal midia é feita por gente, e nesse mesmo espaço existem gente como vc e outros, que conseguem enxergar atraves do muro que parece ter entre o que de fato existe e o que parace que a midia quer que as pessoas acreditem.

    Mas tiro o meu chapeu para pessoas como vc, acredito que os problemas que a midia coloca como ponto maximo das favelas, devem sim serem abordados e falado, só que da forma como são colocados, não ajudam a resolver os problemas, só causam mais problemas e acredito que essa não é nunca foi e nunca deva ser o papel da comunicação. Acho que os problemas não devam ser abordados da forma superficial como são.

    E com isso só levam uma demonização as pessoas que abitam nesses espaços. Com isso causando dois fenomenos. 1º as pessoas que não vivem nas favelas passam a ter uma visão desses espaço como um espaço da negatividade, da criminalidade, da porbreza e da desrodem. 2º as pessoas que moram nesses espaços(favelas) não se reconhecem como cidadão, e não se identificam como membro desses espaços, e como isso essas pessoas passam a ter esse lugar apenas como um espaço provisorio, pois ele acredita que possa atingir um certos estatos social para ir morar num outro lugar melhor. Com isso acaba entendendo que esse espaço aqui é mesmo o que se mostra na TV e como resultado desse fenomeno de não aceitação faz com que as pessoas não se empenhe para resolver os problemas que aqui temos.

    Abraços e parabéns pelo seu trabalho.

    Valdean

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  2. Puxa, Murilo, cheguei a sentir pena por estar de férias e não ter podido participar desta externa...
    A foto que vc escolheu para abrir o texto já é um convite à apreciação do trabalho que eles fazem lá...
    Depois quero ver outras fotos e, é claro, o vídeo editado que, com certeza, tb vai seduzir o espectador pela beleza que vc pôde testemunhar... Parabéns por mais este trabalho!!! Abraço, Sergio

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